quarta-feira, 5 de junho de 2013

The Rain

If I were the rain
would I have been able to link someone's heart
like the rain links the never-touching sky and earth?

domingo, 21 de abril de 2013

Novos Testemunhos

Os versos que se seguem, bem sei, vão ser terriveis. Por uma razão muito simples. Estive muito tempo sem escrever aqui, e agora tenho demasiadas coisas sobre que falar, e por isso não consigo concentrar-me no presente. O que vou fazer é despachar todos os assuntos pendentes de rajada em sequência não-cronológica para que nunca mais tenha de pensar neles e me possa concentrar em coisas maiores e melhores.


A desculpa, bem sei, está sempre na ponta da língua,
o cair da areia. O monte que cresce e enterra o passado.

Mas pelo menos a justificação não merece o silêncio,
e essa dou-a aqui com gosto mas sem tempo,
o ácido sobe a bile e a minha boca é o esgoto.

O estilo é outro, ou o facto de ser outro confirma a teoria
de que o estilo em si é a mudança dos estilos, mas divago.

O coelho saiu da cartola, com todos os truques associados,
ao plano há muito pensado, de ser mais fácil do que foi.
Claro que não, não te adienteis leitor, pois a estaca onde me sento,
é a estaca onde me sentava, e nem Vlad o Impalador me sentaría melhor sentado.

Não falarei mais do coelho, pois tenho uma carta de amor escrita,
explicando cada pulga, cada nojo e cada riso,
carta enviada para a morada errada sim, mas com diferentes frutos mais saudaveis

Cartas essas que passam o mar, vindo encontrar o gato marinho,
que abandonando o seu ninho, fez a sua casa no luar.
Recebo também a casca inglesa, que chega em breve com certeza
se tal for a vontade da sua inglória realeza.

Reciclei destinos antigos, uma pomba vermelha de verde no bico,
companhia de luzes e carne queimada, agora companhia de cinza
e luz apagada.

Começa a rampa que me leva ao sagrado, quatro portas,
quatro janelas mágicas. Motivos aguados no fim do dia
repletos de suor antes do fim, que me fizeram esquecer a primeira razão.

Encontrei-o finalmente! O filho infame do poeta francês,
Descansa errante. O teu lugar é aqui.

Fui caçado por uma raposa, que nada trará de bom,
talvez apenas ritmo. Um duche morno no Inverno,
exercícios de manutenção.

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Obra-Prima

Preparo-me agora para aquilo que será o maior texto que já escrevi, já escrevi e publiquei três textos hoje, que serviram apenas de aquecimento para os meus dedos que se finalizam em gânfias ameaçadoras. Estou num local familiar, escondido pela sombra, e rodeado de amigos, um lobo cinzento, a coruja negra, um gato vermelho, e uma serpente dourada. Outros nos rodeiam mas não merecem nota, pelo menos ainda não.

Mais uma vez a minha escrita é motivada pelo ilustre gato marinho com quem agora raramente comunico, apesar da minha oportunidade para o fazer seja maior. Começarei então por aquilo que fica em mim gravado quando penso nessa criatura.
Ela é e será sempre um modelo de comparação, aquilo que em tempos achei que era o certo para os três, sendo um ser tão ambíguo e dotado de tantas faces que saciaria sem dúvida qualquer necessidade dos meus reinos interiores, no entanto na altura isso não estava destinado e não creio que o esteja agora, o que é pena tendo em conta a sua não indiferença declarada ao mensageiro. Já nem penso em razões, pois uma mente tão volátil como aquela vive muito de reacção e pouco de preempetividade... algo que sempre me chamou. Agora que penso nisso, talvez pudesse fazer mais por mim, talvez pudesse reescrever a história, mas já não tenho paciência. Como referi algures o lobo está velho, e cansado da caçada. Talvez o corvo voe novamente sobre a selva urbana em busca de prata escondida, mas não será hoje nem amanhã, por uma vez o corvo quer defender os seus tesouros, em vez de procurar os que não lhe pertencem.
Reina a paz nesta fronteira.

Neste momento sinto-me tentado a falar daquela que é raiz do meu quadrado, mas não o farei para já, pois ainda há muito por mencionado, e quero, por assim dizer, e não tirando o mérito a todos os outros assuntos pendentes, deixar o melhor para o fim.

Falemos então do caminho. O meu "do".
É uma estrada de terra, consigo ver que é pouco caminhada pois há ervas a crescer por todo o lado livremente, como se nenhum pé ou roda as maltratasse. As linhas que o circundam são tortas e por vezes pouco claras, a vegetação, a terra ou os abismos prestam cerco às pedras que marcam a silhueta do trilho. Em frente pouco vejo, o nevoeiro castiga-me os olhos e encharca-me a roupa lentamente. Nunca chove por assim dizer, mas por vezes dou por mim a desejar que fosse esse o meu problema, assim teria uma desculpa para me abrigar e esperar por dias de sol. Isso era fácil de mais claro, em vez disso sou vítima de uma guerra de guerrilha constante, é esse o problema de ser o mais forte, nenhum obstáculo se atreve a ver a minha face, e quando o fizerem já estarei desabituado e sem forçar para conquistar outro gigante.
Mas esse dia ainda não chegou, e não chegará tão cedo. O Glutão ainda é rei deste território e a estrada leva-me para este, onde me espera tudo o que desejo.
Reira a paz nesta fronteira.

Amanhã mergulharei nas águas profundas para encontrar um velho amigo, um antro de sabedoria antiga e chicotes de carne que são tão afiados como as minhas garras. Estou contente por ver de novo o polvo desde a nossa ultima corrida. Sem dúvida vamos ser fúteis e inuteis, beber nos rios e mijar nos mares para manter o ciclo vivo. Mas não vamos falar do que realmente importa, da estrada e da cadeia alimentar. O polvo tem a sua agenda e eu tenho a minha, penso que a nossa relação será semelhante à da coruja negra, que me acompanha no silêncio inqualificável. Isso seria agradável.
Reina a paz nesta fronteira.

Conheci também um leopardo, o primeiro da sua raça a trilhar o meu caminho, apesar de visitar o seu habitat com frequência. Duas coisas me chamaram para este jovem ser, em primeiro o seu gosto pela rainha de negro, aquela que me inspira todos os dias e que será merecedora de tinta no templo em breve. O segundo factor é a carga dupla de forma perfeita que carrega ao peito, à semelhança do gato marinho . Há no entanto muitas diferenças entre estes felinos, em termos de sabedoria, e em termos de manifestação física e contacto com os vivos. O leopardo não é ambíguo, as suas manchas são uma máscara para um interior sedento de necessidades simples: sucesso, alimento, e foda. Essa realidade é limitativa para aquela que dorme dos dois lados da almofada simultaneamente, mas é também um lufada de ar fresco relativamente aos labirintos que encontro. Este é apenas um corredor, resta-me saber se quero abrir a porta.
Reina a paz nesta fronteira.

Penso que falarei agora daquele que é o meu maior desafio, a última fronteira, a meta que torna as seguintes metas parecerem apenas mais um passo. Sim, para grande espanto da minha parte, ainda busco a toupeira.
E ela dá-me fuga incessante como sempre, mantendo-se sempre à vista e sempre fora de alcance. Oiço-a a escavar círculos na terra sob as minhas extremidades, sem motivo aparente. Sei tão pouco sobre as suas intenções. Sei apenas que é uma criatura de bem, que sonha com um fim para a monotonia, com uma viagem permanente para outra terra, uma ilha para norte que comporta outros tantos que partilham do seu estilo. E mais nada. O que parece impossível pois a razão sente o vácuo e corre para perguntar qual a sequência completa. Se existir eu não a conheço, e não me parece que venha a conhecer tão cedo. Vou aprendendo histórias sobre o passado, nunca sobre o presente ou sobre o futuro. Isso não me sacia minimamente... mas se assim é porque não abandono o barco, tendo terra a vista em tantas fronteiras? Porque é que ambas as minhas partes vêem a solução numa criatura que é tão diferente do que tínhamos idealizado? Não é por promessas antigas, nem por teimosia, nem pelo sabor de desafio. Mas custa-me admitir tanto por algo que é os olhos de tantos é tão pouco. Penso que esta é a ultimate bet. Aquilo que vai definir se o meu julgamento ainda é claro ou se foi há muito corrompido pelos vermes da fruta que como todos os dias. Ainda sou o senhor das maçãs, ainda tenho os meus tesouros a defender e não quero transformar-me numa lebre para perseguir esta toupeira pelos túneis que esta criou. Afinal, a concepção criada pelo meu cérebro é que ela é a solução para o lobo e para o corvo, não para qualquer outro animal ou máscara que possa conjurar.
Há dois sois que não oiço as suas batidas. E o corvo pergunta-se se tudo estará bem, o lobo pergunta-se se é um sinal para mudança e para esquecer o coração e ouvir a mente. Mas nunca é a altura certa para tais decisões, hoje é dia de mais procura, e sei que há poucos limites para aquilo que estamos dispostos a fazer para encontrar esta presa. Temos medo do nosso poder, de que ninguém nos impeça de cometer erros... pois agora os animais partiram e estamos sozinhos no local que nos é familiar. Bebemos o rio e vamos agora mijar no mar, esperemos não nos afogar.
Reina a guerra nesta fronteira.

Nada.

Conheci uma coruja que acha que é nada.
Rara coruja negra que raramente pia,
voámos pelo bosque no trilho de uma fada
mas nada encontrámos senão aquilo que mais temia
Vazios sem tesouro mudámos o nosso rumo
trilhámos pela linha tapados pelo fumo
matámos o seu templo com um rio de fina tinta
intenções nunca as ouve passados dias trinta.
Companheiros estranhos que nunca se desejam
encontram felicidade em rios de línguas mortas
penas que se tocam, mas nunca se cortejam
bicos que se entre-olham e esboçam linhas tortas.

Poema feio e sem métrica que nunca será mais do que espaço
serve a metáfora de não sermos nada, senão o erro do meu traço.

O Início do Fim

Afasto-me neste momento do pêlo e da pena, escrevo com a caneta para dizer algo que pertence apenas ao mundo do mensageiro.

Após a visualização da arte por parte de S.S. o meu cavalo caiu e eu tive uma visão do futuro, do derradeiro objectivo, do sonho partilhado entre os dois que são um. Vi que o sonho estava morto, que mesmo que fosse humanamente possível não serviria senão de memória de uma tentativa falhada, afinal, qual é o sentido da vida?

Para mim sempre foi a eternidade... o derradeiro destino era viver para sempre, metaforicamente e literalmente. Fazer algo tão grande e tão notável que o universo não pudesse esquecer esse feito... isso seria possível. Tantos outros o fizeram tantos anos atrás e desde que há memória escrita que pertencem à lore do mundo. A parte literal da minha demanda é mais complicada, a preservação do corpo em gelo para que um dia a tecnologia possa ressuscitar os mortos e devolvê-los à sua juventude... A criogenia existe e acredito piamente que o dia tudo isto será possível. No entanto ao observar a arte referida apercebi-me de duas coisas.

A primeira é que a raça humana não vai existir para sempre, isso é certo. A Terra deixará de ser habitável muito antes da nossa habilidade de colonizar outros mundos habitáveis. Estou certo deste facto devido aos ciclos inevitáveis o nosso planeta. A idade do gelo vai chegar, e nós, tão desesperados pelo nosso desenvolvimento individual, não vamos estar prontos.

A segunda é que mesmo que a Terra fosse habitável por um pouco mais, o seu espaço não é infinito, a população mundial cresce todos os anos apesar de ser fustigada permanentemente pelos quatro cavaleiros. Quem é que quereria levantar os mortos quando há já demasiados vivos? Quem é que quereria roubar a comida dos seus filhos para a dar à boca a alguém que já viveu demasiado? Cada era tem os seus artistas brilhantes, trazer os antigos nada trará ao Mundo.

Por isso a pergunta que faço é, mesmo que me pudessem ressuscitar no futuro, porque é que o fariam?

Isso traz-me uma nova pergunta, se a vida eterna não é possível, ela não pode ser o derradeiro objectivo, nesse caso, qual é o derradeiro objectivo? Fazer o máximo possível com aquilo que tenho e rezar pela imortalidade metafórica?

Parece-me pouco...

Regresso Tardio

Grandes mudanças se instalaram nesta casa.

O lobo dorme agora sob as estrelas, cansado do calor e da caçada... está a ficar velho, o que lhe traz sabedoria e lhe retira velocidade. Continua a ser o mais forte, mas nunca mais será o mais belo de entre os seus irmãos. O respeito da alcateia cresce, e a lenda ainda está viva, mas o sonho do velho lobo está cada vez mais distante, aquilo que ele realmente quer está cada vez mais morto, se é que essa realidade pode ter tons de cinzento.

O fogo azul viaja para o corvo,
que observa do topo do mais velho carvalho novo.
Os tesouros que o cercam brilhantes
Anseia pelo mais reluzente diamante,
que o complete para sempre.

É interrompido pelo cheiro a sangue morno
Voando rumo à serpente que descansa em torno
de uma grande túlipa cor de morte,
o corvo tenta a sua sorte
e cai de novo por terra.

Este é o presente da irmandade, apresentado fresco mas corrompido pelo passado a meio termo, seguramente relatado em seguida, para todas as estrelas que se tornaram em olhos. Duas brilham com mais intensidade, tendo folheado o tomo pela manhã, regressarão sem dúvida com o crepúsculo, assim que os arautos da desgraça se fizerem ouvir pelas ondas do lago.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Falso Alarme

Não voltaria a escrever tão cedo num caso dito normal, mas acontece que houve um desenvolvimento demasiado repentino para ignorar, e sendo a directa consequência das minhas observações na planície achei por bem resolver já a equação enquanto está fresca.

Estava na planície imensa,
a planear a minha busca
pela toupeira fugidia,
quando ao chegar a uma conclusão
esperei por um tufão
que me trouxe uma pá de ferro.
Usei-a repetidamente escavando em vários locais,
e durante um dia nada vi.

Mas sem problema, o maior plano estava em curso
coisa que não chegou a existir,
pois ao respirar fundo
a toupeira voltou
sentou-se ao longe e observou
os estragos causados por mim.

e toda a minha dúvida foi em vão.
Uma lição para aprender
Não enterrar antes de morrer
e manter forte a ligação.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Crónicas do Polvo e da Toupeira

As seguintes crónicas não estão por ordem cronológica, visto terem lugar no mesmo espaço temporal. Não as juntei no mesmo texto por tratarem assuntos completamente distintos e não-relacionados.


Polvo

Conheci um Polvo,
o segunda da minha vida
e no entanto tudo neste era novo
um pouco estranho talvez
não o ser mais estético das redondezas
mas uma força das profundezas
isso sim.

Um Polvo anfíbio
adepto das melhores companhias
um ser deveras ambíguo
meu camarada em folias
e rios de cevada correram
sem grande toque ou sinal
iguaria oriental que me pareceu
tão diferente ou igual
que não mais me importei
nem de si suspeitei
que o interesse fosse tal
que a bem ou a mal
ficámos por aqui.

Foi uma estrada curta
demasiado simples para me cansar
demasiada esperança para me importar
que esta luta não fosse luta
e mais umas turras a brincar.

Parece simples eu sei
um poema leve em comparação
mas faz bem
o negro não é lei
e o branco hoje tem-me na mão.


Toupeira

Esta sim complicada
Nem o final das frases nem a estrutura da história
vão manter um estilo fixo.
Há muito a dizer sobre este bicho estranho que me levou às origens longínquas.
4 ou 5 anos talvez passaram desde que encontro um ser assim,
tão fechado,
tão inseguro,
tão sozinho.
Já não estou habituado a pessoas fracas,
dependentes,
esses eram os caminhos da minha adolescência.
Agora só me interesso por seres grandiosos,
gatos, corvos, deuses sociais.
Nada que se compare a isto...
esta toupeira tão miserável mas tão bela,
tão chamativa que apenas pede que eu a agarre e levante voo para o meu horizonte favorito.

Mas não é assim tão facil claro,
esta criatura esconde-se a toda a hora
e raramente me procura
aprecio os sons que trocamos mas através da terra.
ela fala-me do subsolo, eu escuto e respondo mas nunca a vejo de perto.
Ela chama-se timidez e coisas que tais, mas há aqui outros problemas
grandes traumas ancestrais que a levam a atitudes tais.

O progresso é lento, se é que isto é progresso,
esta Toupeira é gentil de mais, frágil em demasia,
duvido que lhe possa tocar ao de leve sem que a enterre,
rumo ao centro da Terra, para nunca mais voltar.



Se curiosidade permanece relativamente ao gato marinho e às suas aventuras, sabei que esse escolheu um novo caminho que lhe traz conforto e companhia, e que agora nos vemos com raridade igual a mil. Mas não há qualquer problema, a minha alma está tranquila, e como podem ver as aventuras decorrem sem pensamentos regressistas.
Nas minhas costas apenas pó. À minha frente o Universo.

Planície

Em breve falarei de todos os assuntos pendentes que deixei por proferir, infelizmente este espaço tornou-se alvo dos meus desabafos amorosos e sexuais e cada vez menos sobre mim mesmo, os meus duelos interiores, o lobo e o corvo, aquilo que era suposto ser.
Mas hoje surgiu um grande grande problema, algo com que nunca me tinha deparado. Já antes tinha encontrado vazios e abismos e sabia perfeitamente o que fazer. Mas hoje... hoje cheguei a uma planície gigante, de horizonte a horizonte, apenas vejo o caminho por onde vim, mas n vejo nada em nenhuma outra direcção, só kilometros e kilometros de nada, o que para mim é totalmente alienígena visto estar habituado a escaladas impossiveis, a florestas cerradas nas quais me perco e em rios de correntes fortíssimas.
Mas para novos problemas, novas soluções, e esta será rebuscada. Visto que não há nada à superfície vou escavar até encontrar aquilo que vim buscar.

Os próximos passos serão um retrocesso pois datarão questões a priori da planície mas a posteriori da loucura. Espero que ainda assim façam sentido metafórico para quem o quiser decifrar.

Até à próxima.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Loucura

Esta mensagem será um pouco diferente das anteriores, pois também o meu estado de espírito é diferente. Apesar de grande parte do que foi dito carregar uma forte componente emocional, tudo foi previamente pensado, sofrido e só depois relatado aqui, por motivos irrelevantes. Desta vez no entanto a metamorfose emocional e psicológica está a ocorrer enquanto escrevo estas linhas, e por essa razão será a prosa o envelope deste postal.

Devo referir também que considero tudo o que direi aqui como sendo prematuro, necessitado e revelador de alguma falta de carácter. Resta-me apenas dar a informação de que este texto é maioritariamente para os olhos do gato marinho, e como sei que esses olhos não verão estas linhas por iniciativa própria, confio no ouriço para quando (ou porque tomou essa iniciativa ou porque perdi a paciência) se aperceber desta mensagem comunicar ao gato marinho que nade até estas margens.

Terminada a longa introdução dou início ao texto propriamente dito.


Ao que parece estou louco. Repito o mesmo processo e acredito num resultado diferente, pois minto a mim próprio dizendo que há condicionantes que alteram o processo. Nem sei como posso dizer isso se nem conheço as condicionantes, e os últimos dias têm vindo a provar isso mesmo. O Mar de azul e dourado foi molhar as praias da Ilha do Norte e tive esperança de que um dia me voltaria a banhar nas suas águas... Mas isso está no passado e serve aqui apenas motivos de comprovação da demência que se alastra por mim.

Vamos ao que interessa, a Pulga na balança, a Unha encravada, a minha Doença favorita... se as minhas palavras aqui ofendem tal não é a minha intenção, relato apenas as imagens que o meu coração envia ao meu cérebro e indirectamente aos meus dedos. Mas estou a divagar, falava da comparação. Julgava eu ignorante sonhador que dentro de muitas luas também o Gato que já foi Corvo navegaria para a Ilha do Norte e aí todo o nosso contacto e afeição, que na minha mente doente era sabido, se perderia. Um preço que pagaria de bom grado, e contestaria até com investidas financeiramente suicidas para que esse carinho não se perdesse. Mas os Deuses assim não o quiseram. Pois na minha loucura calculada nem o que eu esperava ser o meu fim foi alinhado com o meu horizonte.

Morri na praia, ou assim me parece, não que esperasse muitas coisas de um ser dotado de tantas particularidades desconhecidas. Contava talvez na pior das hipóteses com um crescendo que culminasse numa tentativa frustrada e uma conversa sobre zonas, mas não tive essa bênção. Num dia subia uma rua rumo à felicidade quando ao virar da esquina me deparei com o vazio. Um grande buraco no chão, em direcção ao centro da Terra, vi umas poucas ilhas de pedra que tentei alcançar feito jogo de plataformas, mas rapidamente me apercebi na impossibilidade de chegar a outro lado, se é que havia outro lado. Só posso agora esperar por um milagre, mudar de direcção e abandonar a cidade felina para sempre, ou voltar para trás e começar tudo de novo, o que não me parece que me fosse permitido.

O silêncio é esmagador nesta pequena ilha de pedra onde me sento com as pernas cruzadas à chinês porque assim pareço mais fixe e combina com o meu cabelo de tentativa falhada de referência oriental. Hoje não sou um animal, sou muito menos, sou só um homem sem máscaras que não sabe onde errou e por essa razão vai continuar a errar.

Olho para baixo, para o abismo, e quero tanto abandonar, mas como sou louco acredito sempre numa solução e que uma ponte entre as ilhas me vai surgir. E estou certo de que vai, mas será uma alucinação, o que vai resultar na minha queda, prevista já na anterior mensagem deste espaço informático, se bem que por razões diferentes.

Os parágrafos tornam-se mais curtos não por ter menos assunto mas porque mais tempo passa até saber o que dizer, deixando assim tantas coisas para trás. A verdade é que quero dizer tudo mas não quero que ninguém saiba nada, e por essa razão pergunto-me se ao terminar este texto o guardo ou deito fora, não faço ideia do seu tamanho mas calculo que nenhuma pessoa sã terá paciência de o ler até ao fim. Menos mal creio, assim posso escrever à vontade, dizer tudo sem ninguém ler nada, e sentir-me-hei para sempre melhor tendo encontrado esta solução.

Posso estar perdido mas não estou cego, sei que a minha oportunidade se eclipsou, se é que alguma vez tive uma oportunidade, mas o que eu queria agora era muito menos que isso, era apenas saber porquê. Porquê o afastamento, porque é que num dia tudo era possível e no outro há uma exclusão tão grande e tão dolorosa que faz ranger os dentes. Primeiro silêncio digital, seguido de contacto visual nulo, seguido de contacto fonético mínimo, seguido de contacto quase obrigatório, seguido de novo silêncio mortal. Sei que em nada mudei a minha atitude e que nada fiz para alterar este rumo da história, e o que o gato falante diz é que não é nada comigo, que o problema é exterior e que todos os pequenos corvos sofrem do mesmo afastamento neste momento e que daí não devo pensar mais nisso... Não devo pensar mais nisso? Não consigo pensar em mais nada! Tenho uma cobra a devorar-me o cérebro e só vai parar quando engolir a merda responsável pela memória. E sei que agora vai haver barulho por todo o lado e animais a fazer os seus sons característicos mas que significam todos a mesma coisa: "Mas ninguém te prometeu nada! Como podes sentir falta de algo que nunca foi teu?!". Não sei. Chama-lhe loucura, chama-lhe desespero, chama-lhe amor. Chama-lhe tudo o que podia ter sido e nunca foi, e provavelmente nunca será. Só sei que a minha consciência está tranquila, e que na minha mente já vi tudo o que pode e não pode acontecer, pois nos últimos dias tem sido esse o meu único propósito. Neste momento estou sereno, só não aguento mais surpresas más... Venha de lá o carrasco, não me cortes é as mãos em vez da cabeça, preciso delas para escrever mais tentativas de chamar à atenção dizendo muito mais do que queria.